data-filename="retriever" style="width: 100%;">Foto: Gabriel Haesbaert (Diário)
Na coletiva, realizada nesta terça-feira, o Ministério Público (MP) disse partilhar do luto das famílias dos 242 jovens que morreram na madrugada de 27 de janeiro de 2013. Estranhamente, é a mesma instituição que, em 2015, por meio de promotores locais, moveu ação judicial contra três pais e uma mãe. Promotores daqui, à época, processaram os pais por calúnia e difamação.
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Eles se mostravam indignados porque esse grupo de pais colou cartazes pela cidade ao fazer críticas aos órgãos públicos e aos próprios promotores. Nesta terça, o promotor Marcelo Dornelles fez um mea culpa ao dizer que a relação entre as partes, no passado, teve problemas. De fato, os promotores que assumem, daqui até 16 de março (data da realização do Tribunal do Júri), não têm nada a ver com o que fora feito por outros colegas daqui ao processarem os pais das vítimas mortas na casa noturna.
Uma das promotoras designadas para o caso, Lúcia Helena Callegari, falou estar ao lado das famílias e que buscará com que os quatro réus sejam punidos. O que foi endossado pelo outro colega que atuará com ela no julgamento popular, o também promotor David Medina da Silva. É verdade que, em termos de estratégia e do que é pleiteado pelo MP e pela própria Associação dos Familiares de Vítimas e Sobreviventes da Tragédia de Santa Maria (AVTSM), em que ambos buscam a condenação dos quatro réus, é necessário que a relação esteja bem azeitada. O MP, é bom que se reconheça, age agora como sempre deveria ter sido desde os primórdios do caso: ao lado dos familiares.
O fato de um promotor ser questionado não pode ser visto como afronta. Não se pode admitir qualquer tipo de corporativismo frente à tamanha dor que esses pais e mães - alguns, inclusive, já mortos - passam (e seguem passando) desde o incêndio que tragou a vida de meninos e meninas. A intimidação lá de trás, protagonizada por promotores, acabou em 2018 depois que foi retirado o processo contra os pais.
Nem por isso, o passado pode ser apagado. Resta lembrar que desde quando a boate abriu as portas, em 2009, até a fatídica madrugada de 27 de janeiro de 2013, o local sempre funcionou de forma irregular. Tudo, à época, com a anuência da prefeitura e do próprio MP. Quem disse isso, e que constou em um longo inquérito policial, foi a própria Polícia Civil. Está tudo lá. O inquérito policial da Civil resultou no indiciamento criminal de 16 pessoas. Deste total, quatro restaram e que irão a júri.
Lá atrás, em 2011, o MP foi alertado quanto à existência de irregularidades junto à casa noturna e, inclusive, poderia ter sido interditada. O resultado, à época, foi um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) com a direção da boate. O saldo? Obras para resolver problemas de poluição sonora, o que era motivo de queixa dos vizinhos da boate desde a abertura.
A Kiss, como se viu, virou uma espécie de labirinto com a colocação de barras de ferro (para controlar a entrada e a saída do público), janelas dos banheiros lacradas com pregos e pedaços de madeira, e a colocação de uma espuma tóxica e altamente inflamável.
O luto que o MP externou publicamente hoje, quase sete anos depois do incêndio, chega tarde às famílias.